
— Por que acha que não poderia?
— Não sei. As pessoas são loucas. Apedrejar-me-iam na rua gritando “blasfemador”, “hipócrita”, se eu disser que conversei com Deus.
— Mas não é você o cara que sempre se diz que não se ofende com nada?
— Sim, sou.
— Hipócrita!
— Ei, Deus tem senso de humor?
— Eu inventei o senso de humor.
— É verdade… Mas me diga, por que você não fala com as pessoas?
— Eu falo, mas elas não me ouvem.
— E por que estou ouvindo?
— Você é louco, de uma imaginação fértil!
— Hem?
— Calma! É apenas senso de humor divino.
— Posso perguntar coisas?
— Você tudo pode.
— Uh, obrigado. É a primeira vez que ouço isso.
— Pergunte o que quiser.
— Ahhh… O Brasil vai ser hexa em 2010?
— Não seja estúpido!
— Ei, relaxa… Além disso, eu pensava que Deus usava termos mais sofisticados, como o correto emprego dos pronomes oblíquos.
— Por quê? Eu tenho todos os termos do mundo e uso aqueles me fazem ser compreendido mais rapidamente. Um humano certa vez disse: “Faça as coisas o mais simples que você puder, mas não as mais simples.”
— Quem foi o louco que disse isso?
— Ok, chega de papo furado. Cadê suas perguntas?
— Certo. O céu existe?
— Vá lá fora e olhe pra cima. Se houver algo azul lá, sim.
— Não, digo o paraíso!
— Depende.
— De quê? De eu fazer coisas boas ou ruins aqui na Terra?
— O que são coisas boas e ruins?
— Não sei. Todo mundo sabe o que é certo e errado.
— Eu não sei.
— Ah, tá certo. Matar é uma coisa ruim.
— É verdade. Como daquela vez em que o cara matou o bandido que estava apontando uma arma pra cabeça de sua família.
— Bem, essa foi uma situação excepcional.
— Se há situações excepcionais, então não existe de forma absoluta. E se não existe de forma absoluta, então não pode ser classificado como bom ou ruim.
— Então coisas boas e ruins não existem.
— Você ouviu alguma palavra do que acabei de dizer, filho?
— Desculpe, me distraí com aquele esquilo ali.
— He, he! Boa.
— O que tens a dizer sobre o paradoxal fato de existir um homem invisível que mora no céu, que vigia tudo que as pessoas fazem, todos os minutos de seus dias. Onde esse homem invisível tem uma lista especial de dez coisas que ele não quer que façamos. E se fizermos qualquer uma dessas dez coisas, ele tem um lugar especial cheio de fogo e brasa ardendo, e tortura e sofrimento, para o qual vai nos mandar viver e sofrer e arder e sufocar e gritar e chorar, para todo o sempre, até o fim da eternidade… mas que me ama?
— Quem é esse homem invisível? Admito que não o conheço.
— É você, Deus!
— Eu??? Eu não faço nada disso. Eu te amo, certo, mas não sou invisível.
— Ah, não? Então cadê você?
— Estou em todos os lugares. Sou esse monitor LCD, esse travesseiro que você coloca na cadeira pra suas costas não doerem, sou essas bonequinhas hentai que estão sobre a escrivaninha.
— Shhh… Já entendi.
— Sem contar que um de meus filhos mais sábios cantou: “Eu sou a luz das estrelas/Eu sou a cor do luar/Eu sou as coisas da vida/Eu sou o medo de amar…”
— Ele também conversou com Deus?
— Sim, e logo depois ficou conhecido como “O Maluco Beleza”. Talvez você deva pensar num adjetivo que defina a loucura da qual as pessoas acusar-te-ão depois dessa postagem. Existe na sua cidade “O Maluco do Veneno”. Seja “O Maluco do Ácido”, então. Mentes brilhantes saberão o porquê.
— Muito corrosivo esse nome.
— Druuum, bassss!
— Ha, ha, ha!
— E que lista? Como em “My Name Is Earl?”?
— São chamados os dez mandamentos.
— Não escrevi nada parecido. Vi algo aqui no Google e diz coisas como não matarás e não cobiçar a mulher do próximo… Que absurdo. Seria contraditório de minha parte ditar regras depois de ter feito correr o rumor de que as pessoas têm livre-arbítrio.
— Demasiadamente. E existe o inferno, ou esse lugar cheio de fogo, blá, blá, blá?!
— Você quer que exista?
— Não.
— Então não existirá!
— Basta querer?
— Sim. Se você realmente acha que existe esse lugar e pensa que vai parar lá quando morrer, então você vai.
— Não me parece muito lógico.
— A eletricidade também não parece ter muita lógica, mas existe.
— E se eu pensar que vou a um lugar onde chove cerveja e bolinhos, onde passa coisas realmente úteis na televisão e onde é possível navegar no Internet Explorer sem se irritar, quando eu morrer, assim será feito?
— Não me parece um mundo muito… interessante… mas a resposta é sim.
— Não me julgue.
— Eu não julgo… Apenas observo.
— Então porque julgaste?
— Tentei imitar um humano. Vocês julgam demais.
— Eu, não!
— Você também!!! Com menos intensidade, certamente, mas ainda julga.
— Tenho milhões de outras perguntas pra fazer… Nem sei por onde começar.
— Ei, esse texto está ficando muito grande, não acha? Apenas três pessoas o lerão completamente e você vai suspirar de desgosto, esboçando uma infelicidade.
— Então posso escrever um livro onde mostro meu diálogo com Deus?
— Poder você pode. Você pode tudo, aliás. Mas saiba que já fizeram isso. Sugiro continuar apenas no blog.
— Ok, você quem manda.
— É, eu sei.
— Então, falou!
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Giuliano Marley